quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

As pessoas grandes

As pessoas grandes passam a vida a inventar coisas aborrecidas que eu tenho que fazer. Estou a brincar com as minhas bonecas ou a fazer desenhos, e lá vem a avó:
- Carolina, são horas de ir tomar banho.
Ou estou sentada no sofá, a ver desenhos animados e a chuchar o dedo, e o avô:
- Meninas,
(quando o avô diz meninas, já sei que está a falar para mim e para a avó)
vão sendo horas de lavar os dentes e ir para a cama.
Acho que chamam a isto educação, mas se a educação é isto é uma coisa muito aborrecida. A educação, pelos vistos, é ter de fazer aquilo que não nos apetece nada fazer.
E depois a mania das horas. Os grandes têm horas para tudo e não me deixam em paz por causa dessa mania. São horas de tomar banho, são horas de jantar, de ir para a cama, de dormir, de levantar, de vestir, de ir para a escolinha. Por causa disso, parece que andam sempre com pressa e aborrecem-se se as coisas não se fazem às horas que eles entendem.
Mesmo assim, o avô e a avó têm muita paciência comigo. São como as outras pessoas grandes, têm a mania das horas, mas não me obrigam a fazer logo, logo, o que têm na cabeça. Deixam-me brincar mais um bocadinho, mas depois acabo sempre por ter de fazer o que eles querem. Menos comer bem, quando não me apetece.
- Vá, uma garfada à Popey – diz o avô, para me animar.
Às vezes, para brincar com ele, ponho só um bocadinho muito pouco de comida no garfo e deixo-o ficar no ar, para ele ver.
- Oh – diz o avô, a fingir-se triste – essa é à Olívia Palito.
Mas logo a seguir encho uma garfada grande.
- Ah, assim é que é.
E os olhos do avô riem-se muito.

O sonho

Quando fica em nossa casa, a Carolina dorme com a avó.
Hoje de manhã, depois de todos arranjados (o que leva o seu tempo, porque é preciso lavar e vestir, tomar o leite, ver desenhos animados, brincar um bocadinho), fomos levá-la à escolinha. Pelo caminho, a avó pediu-lhe:
- Tu esta noite tiveste um sonho. Conta à avó o que é que sonhaste.
Ela ficou calada.
- Eu vi que tu sonhaste – insistiu a avó.
Pareceu pensar um instante, como se tentasse lembrar-se. Por fim, arrumou a questão:
- Os meus olhos não viram nada.
- Pois é – disse o avô. – Quando nós sonhamos é como se víssemos as coisas, não é?
Acho que o avô tem razão. Esta noite não me lembro de ter visto nada, por isso não tenho nenhum sonho para contar.