sábado, 13 de junho de 2009

Ora toma, avó...

A Carolina tem alguns hábitos que o avô e a avó, pela educação que tinham os meninos nos tempos mais austeros em que foram meninos, quando se esperava e se exigia que uma criança bem educada se comportasse como um adultozinho em formato miniatural...
Está complicado, voltemos ao princípio.
A Carolina tem alguns hábitos que o avô e a avó, pelas razões ditas, têm às vezes a tentação de achar menos próprios, mas quase sempre a ternura prevalece e essas ideias feitas que aperreiam os pimpolhos são deixadas de lado. Enfim, o avô e a avó deixam a Carolina ser uma menina de quatro anos, não a apertando precocemente nos espartilhos da "boa educação". Nestas coisas, lembro-me sempre da figura tristemente exemplar do Eusebiozinho, que Eça desenhou n' "Os Maias". E os avós, que diabo, é mesmo da sua condição serem mais indulgentes e passa-culpas.
Enfim, a Carolina poucas vezes come à mesa connosco. Dado que, além do mais, é "um pisco", como diz o avô, a avó dá-lhe quase sempre de comer antes de nós, e por onde calha: no sofá, a ver desenhos animados; no baloiço; no jardim, quando o tempo convida. Depois comemos nós, enquanto ela se entretém a brincar com qualquer coisa.
Há dias, ao almoço, ela reparou que a avó e o avô puseram um pó num copo, a que juntaram um pouco de água, e depois mexeram.
- O que é isso, avó?
- É um remédio.
- Para quê?
- É um remédio para os ossos.
- O avô também toma?
- Também.
O avô mete-se na conversa:
- Vais ver como a avó faz muitas caretas a tomar este remédio.
- Fazes, avó?
- A avó é muito fiteira - acirra o avô.
- Não sou nada - defende-se a avó - o remédio é que é muito mal gostoso.
A Carolina fica um instante em silêncio. Depois olha a avó, como quem diz: sempre quero ver se é verdade.
- Ora toma, avó...
O avô tinha mesmo razão: a avó fechou os olhos, contorceu a cara num esgar, soltou uns sons guturais, e a Carolina, claro, fartou-se de rir. E achou tanta graça que exigiu que o avô, que nunca faz essas fitas, as fizesse dessa vez.
Na semana seguinte, viu fazer a mesma operação de despejar os pozinhos nos copos. E o pedido veio logo:
- Ora toma, avó...